Estilo é estilo. Há quem se faça reconhecer por meio da forma como registra suas impressões sobre o mundo e suas barbaridades, amenizando-as ou, pelo contrário, destacando-lhes a natureza fora do comum, seja por absurda, cruel ou só estranha mesmo, ao passo que também existem aqueles que, mais ainda, conseguem ser invejados por isso. Filmes que, de uma forma ou de outra, tratam do homem, sua interação com o ambiente e as consequências mais deletérias desse fenômeno (o apocalipse, no pior cenário) já se tornaram o clichê por excelência do cinema mundial hoje. Filmes como “O Elixir”, por outro lado, sempre tiram do aparentemente banal as necessárias reflexões sobre os assuntos que atormentam a multidão humana desde o princípio dos tempos, ainda que sem de maneira oblíqua. Kimo Stamboel faz justiça à fama da indústria cinematográfica da Indonésia nos últimos dez anos — plural, inventiva, surpreendente —, e consegue misturar um punhado de chavões para obter uma história perturbadora sobre uma encrenca velha como o mundo.
Enganosa, a abertura vem embalada num longo flashback, que culmina com um carro invadindo uma festa de casamento de acordo com os costumes de Wanirejo, uma vila ficcional a poucos quilômetros de Jacarta. Um multimilionário pai de família, casado com uma mulher trinta anos mais jovem, encontra a fórmula da juventude e renova a esperança da esposa, Karina, de terem um filho em comum. Na outra ponta, Kenes, a filha do primeiro matrimônio, sai da capital do país para tratar de uma possível sucessão nos negócios, acompanhada do marido, e de Raihan, o filho dos dois. A partir do momento em que pisam na herdade do patriarca, todos começam a se estranhar: Kenes não faz nenhuma questão de manifestar cordialidade com Karina, que flagrara na cama com o pai anos antes; Bambang, o primogênito, ouve merecido sermão do cunhado por ter perdido o pé na realidade e só saber jogar videogame, e na sequência é exposto por Kenes, que descobriu que é traída e quer divorciar-se. Quando se vai pensando que o caos já está definitivamente instalado, o anfitrião transforma-se num zumbi medonho, devido à tal beberagem do título.
Esse é o gancho de que Stamboel e os corroteiristas Agasyah Karim e Khalid Kashogi valem-se para chegar ao outro núcleo, o da camponesa Nihsing, que servia mesas na cerimônia mostrada na introdução. Esses dois universos antagônicos, mas complementares, colidem, mas unem-se no esforço de eliminar os monstros que nasceram da vaidade dos de cima. O diretor é hábil em manter o foco nos monstros, ao passo que nunca deixa de sacar uma ou outra lembrança ao conflito original, respaldado pela química e pela eficiência de seus atores. A Eva Celia Latjuba e Mikha Tambayong junta-se Claresta Taufan Kusumarina, explicitando a vontade de capturar a atenção do público feminino. Se zumbis não passam de mortos que se apegam à vida como crianças a uma roupa que já não serve-lhes mais, mulheres talvez vislumbrem mais depressa uma solução para sua birra.
Filme:
O Elixir
Diretor:
Kimo Stamboel
Ano:
2025
Gênero:
Suspense/Terror

