Uma mulher transforma encontros em serviço rentável, apresenta pessoas compatíveis, recolhe informações, promete resultados verificáveis. Em seguida, o próprio desejo invade o processo e desmonta a rotina de planilhas e contratos. A partir daí, o conflito fica nítido. A protagonista, Lucy, quer expandir a empresa de casamentos e provar que consegue entregar relações estáveis a quem paga por elas. Logo ela reencontra John, ex-namorado sem estabilidade financeira, ator em busca de espaço, e inicia um vínculo com Harry, milionário carismático ligado ao círculo de clientes. “Amores Materialistas” coloca esses três corpos em órbita e testa, passo a passo, a ética do negócio e a coerência das escolhas íntimas.
O objetivo de Lucy é claro: crescer. Para isso, precisa fechar contratos, sustentar a taxa de sucesso e preservar reputação. A aproximação com Harry funciona como atalho, porque oferece acesso a dinheiro e influência, acelera a expansão da empresa e legitima a casamenteira diante de quem enxerga o amor como investimento. A escolha traz um obstáculo imediato. O vínculo cria conflito de interesse, já que Lucy passa a circular como parceira afetiva de alguém que também é peça do seu tabuleiro profissional. A consequência aparece quando clientes percebem que decisões dela deixam de ser neutras. Um jantar que deveria aproximar um casal vira palco para Harry, desloca o foco da conversa e compromete o serviço contratado. Nada é dito como tese; a cadeia de causa e efeito se impõe pelo que acontece em cena.
John entra como contraponto. Ele não oferece alavancagem financeira, oferece história em comum e intimidade construída. Seu retorno produz a primeira virada: Lucy precisa decidir se conta a Harry esse passado, o que pode afetar negócios, ou se esconde, o que mina a honestidade do vínculo. A decisão de ocultar, ainda que por um tempo, inicia uma sequência de pequenos acidentes. Mensagens sem resposta, trocas de agenda, lapsos de atenção em reuniões. Quanto mais Lucy ajusta a narrativa para agradar Harry e os clientes, mais o passado com John cobra coerência. Essa tensão alimenta a escalada dramática e expõe o nervo da trama.
Os diálogos movem a história. Em conversa com uma noiva, Lucy defende que segurança financeira reduz interferências emocionais e facilita o compromisso. A fala volta quando John, em cena posterior, pergunta se ela ainda se reconhece nas próprias escolhas. A pergunta não busca slogan, exige definição de posição. Em outro momento, Harry trata o trabalho dela como consultoria de alto padrão. A palavra realoca o pacto entre os dois e explicita um desequilíbrio, porque Lucy passa a ser avaliada não como parceira, mas como prestadora. A mudança altera o sentido de gestos cotidianos, como uma carona ou um convite para um evento, que deixam de soar como afeto e passam a operar como pagamento indireto.
A estrutura acompanha apresentação do negócio de Lucy, desenvolvimento do triângulo, escalada por choques éticos e resolução baseada em escolha concreta. Não há facilidades mágicas. Quando Lucy troca um compromisso com John por uma oportunidade de networking com Harry, ela perde o encontro e gera desconfiança. Quando tenta compensar com uma noite reservada, a tentativa é atravessada por ligação de cliente atendida no viva-voz. A montagem mantém a causalidade visível. Elipses encurtam deslocamentos, mas preservam efeito, sempre retornando às consequências de decisões anteriores. O ritmo acelera quando Lucy tenta conciliar tudo, com cortes que aproximam reuniões, telefonemas e encontros, e desacelera quando ela encara a verdade que vinha evitando, com planos mais longos que esticam o desconforto. Essa oscilação não enfeita, informa o estado mental da personagem e o tempo dramático.
A direção escolhe enquadramentos que reposicionam informação e ponto de vista. Quando Lucy atua como casamenteira, a câmera recua, inclui mesas inteiras, transforma pessoas em dados, reforça distância analítica. Nas cenas com John, o quadro aproxima rosto e mãos, exibe hesitação, corta menos, sugere convivência prévia sem explicações. Com Harry, os ambientes ganham brilho de evento, música que por vezes cobre trechos de diálogo e interfere no que se escuta, portanto no que se entende. Em uma festa, a trilha encobre a metade de uma confissão; o espectador só recupera a informação quando outro personagem cobra resposta. Som e música, assim, não funcionam como ornamento, mas como ferramenta de foco e tempo, deslocando a atenção e adiando verdades que pesam no conflito.
As atuações reforçam essa funcionalidade. Dakota Johnson compõe Lucy como alguém que vende convicção profissional para conter uma dúvida em crescimento. Quando promete a um casal que a parceria certa resolve inseguranças, a promessa soa treinada, o que prepara a fissura seguinte. Chris Evans dá a John uma insistência objetiva: ele não pede pena, pede clareza de termos, quer saber que lugar ocupa, não aceita meia resposta. Pedro Pascal constrói Harry atento a sinais sociais, capaz de traduzir afeto em oportunidade, ligando sedução a resultado prático. Essas escolhas não pedem rótulos de herói ou vilão; colocam cada um em uma ponta de uma equação que o filme demonstra com eventos sucessivos.
O clímax acontece quando a empresa de Lucy sofre abalo de reputação. Um cliente questiona a neutralidade do processo, cita a relação dela com Harry e ameaça rescindir contratos. A cena obriga Lucy a separar, em voz alta, trabalho e vida, e admitir que misturou os dois por conveniência. A partir desse choque, a resolução se apoia em decisão verificável. Encerrar o vínculo com Harry e arcar com custo financeiro e de imagem, ou mantê-lo e aceitar que a vida íntima virou extensão do serviço prestado. A escolha por John não aparece como prêmio romântico; aparece como ajuste de coerência com tudo que a narrativa plantou. Se o sentimento exige risco e tempo, ele não cabe no roteiro de metas aplicado aos clientes. O casamento simples sela essa decisão e produz efeitos concretos, como a necessidade de reposicionar a empresa e reconstruir confiança, agora com novos critérios de atuação.
Há um paralelo possível com “Vidas Passadas”, também dirigido por Celine Song, no interesse por decisões que repercutem anos depois. Aqui, no entanto, o dinheiro sai dos bastidores e ocupa o centro como variável assumida. Quando Lucy tenta transformar isso em regra universal, a história devolve fatos que contradizem a generalização: contratos fechados, festas e promessas medem risco, não medem vínculo. Essa constatação orienta a última sequência, que oferece saldo, não sentença moral. O núcleo do filme não é a pergunta abstrata sobre quem é o par certo; é a conta exata do que se perde e do que se ganha a cada decisão.
Ao terminar, “Amores Materialistas” sustenta o próprio título. Não condena interesse financeiro nem idealiza precariedade. Descreve escolhas e mostra seus efeitos sobre a vida que se leva. O espectador acompanha a cadeia completa, do primeiro contato comercial à decisão íntima, e entende, passo a passo, como um negócio lucrativo pode interferir na linguagem de quem o conduz. Quando Lucy enfim assume o que quer, a narrativa não abre espaço para slogan; abre espaço para trabalho de reconstrução. O romance aqui não apaga custo, calcula consequência. É por colocar a consequência no centro que a história se fecha com sentido.
Filme:
Amores Materialistas
Diretor:
Celine Song
Ano:
2025
Gênero:
Comédia/Romance
Avaliação:
8/10
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Marcelo Costa
★★★★★★★★★★
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