Na noite desta quinta-feira (25), as companhias aéreas Gol e Azul anunciaram oficialmente o fim das negociações para uma eventual fusão, movimento acompanhado de perto pelo mercado desde 2024. A decisão também resultou na rescisão do acordo de codeshare firmado entre as empresas em maio do ano passado, que permitia o compartilhamento de voos e a integração parcial de suas malhas domésticas.
No caso de Gol e Azul, o codeshare abrangia principalmente rotas exclusivas de cada companhia, garantindo ao passageiro maior conectividade pelo território nacional. Embora seja um contrato independente de eventuais fusões, especialistas destacam que a rescisão pode estar relacionada a cláusulas estratégicas previamente estabelecidas.
Segundo Fernando Canutto, sócio do Godke Advogados e especialista em Direito Societário, a decisão faz sentido diante do novo cenário. “Se o contrato de codeshare tiver cláusulas de rescisão vinculadas à fusão — o que é possível em acordos estruturados com visão estratégica —, o fim das negociações pode, sim, autorizar o rompimento. Caso contrário, as companhias poderiam continuar a cooperar normalmente”, explica.
Canutto acrescenta que fatores de mercado também podem ter pesado na decisão. “O dólar tem registrado quedas, o que reduz custos operacionais e facilita o acesso às passagens. Nesse contexto, as companhias podem ter entendido que o acordo já não era mais necessário”, afirma.
O que muda com o fim da fusão?
Segundo o especialista, o encerramento das tratativas de fusão, por si só, não gera consequências jurídicas imediatas, desde que a negociação estivesse em fase preliminar e não vinculante. No entanto, a análise depende da existência de instrumentos formais como Memorandos de Entendimento (MoUs), Term Sheets ou acordos de exclusividade.
Esses documentos podem conter cláusulas de confidencialidade, obrigações de exclusividade ou até penalidades em caso de desistência sem justificativa. Caso não haja tais compromissos, a desistência é considerada um desdobramento natural de negociações complexas.
O risco maior seria a identificação de má-fé ou manipulação de mercado. Nesses casos, as empresas ou seus administradores poderiam responder perante a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e até enfrentar ações de investidores. “Se restar demonstrado que o anúncio foi usado de forma artificial para inflar preços das ações ou induzir o mercado ao erro, pode haver responsabilização. Mas isso exige prova de dolo ou culpa grave”, alerta Canutto.
Transparência ao mercado
A divulgação de tratativas de fusão, mesmo quando ainda não vinculantes, é obrigatória em empresas listadas, nos termos da Instrução CVM 44/2021. O objetivo é garantir transparência aos acionistas e investidores, sobretudo em casos de especulação.
No caso de Gol e Azul, tanto o anúncio das negociações quanto o comunicado sobre seu encerramento foram tratados como fatos relevantes, reforçando o dever de prestação de contas ao mercado.
Com o fim do acordo de codeshare e das tratativas de fusão, as duas companhias retomam suas operações de forma independente, em um momento em que o setor aéreo brasileiro busca recuperação gradual e estabilidade após os anos mais turbulentos da pandemia.